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Ser humano em tempos digitais

Lembro que quando resolvi fazer pós-graduação em Marketing e assim colocar definitivamente um rumo na minha carreira, em uma das primeiras aulas, um professor – daquele tipo que cita definições do Kotler ou Poter, ou ainda Jack Welch ou mesmo Jim Collins em uma recepção entre amigos -, disse que, para ser um bom profissional de marketing, era preciso ler pelo menos dois jornais diários, três revistas semanais e cinco livros de negócios por mês. Entrei em pânico. Que horas eu iria fazer isso, trabalhando o dia inteiro, me deslocando no trânsito pelo menos três horas do meu dia e tentando ter uma vida pessoal paralela? Os gurus que me perdoem, mas é humanamente impossível “consumir” tanta informação, e pior, transformar isso tudo em algo que faça sentido no dia-a-dia das empresas. Lembro de ter pensado que nunca chegaria a ser uma executiva de sucesso com todas essas exigências. 

Estou falando dos idos de 1996. Por mais antenado que fosse o professor, imagino que, naquele tempo, ele nem sonhava com a proliferação de mídias sociais, ferramentas de busca, enciclopédias coletivas e a transformação da maneira como as pessoas se comunicam e se mantêm informadas. O que parecia uma avalanche de informação cresceu exponencialmente. Assustador, não? Mas a nova geração lida com essa realidade com naturalidade. Mais do que fonte de informação, é pela internet que as pessoas expõem suas opiniões, se relacionam, procuram emprego, compram, se divertem e muito mais. 

Contrariando todas as minhas próprias previsões pessimistas, tive uma carreira de sucesso em marketing. Não segui “Os 7 hábitos das pessoas muito eficazes”, não sei até hoje “Quem Mexeu no Meu Queijo”, não “virei minha própria mesa”, não apreciei em nenhum museu “A arte da Guerra”, não cruzei o abismo, mesmo porque tenho um certo medo de altura, e mesmo assim, cheguei até aqui. Onde é o aqui? Onde faço um trabalho que tenho orgulho de fazer, sou respeitada pelos executivos pares, independentemente do meu gênero, sou admirada por colegas e jovens profissionais que passaram ou estão no meu time, consigo ter um equilíbrio entre minha vida pessoal e profissional e ainda me divirto. Claro que isso não deve ser unanimidade. Deve haver aqueles que não gostam ou não concordam com meu estilo, mas como não dá para fazer todo mundo feliz, me contento em estar feliz com minhas escolhas e conquistas. 

 Não estou desmerecendo os best sellers e os gurus do mundo dos negócios. Eles têm um papel importante nas mudanças que ocorreram no mundo corporativo nas últimas décadas, mas muitas vezes eles se contradizem. Livros como “O Ócio Criativo” e “Inteligência Emocional” que o digam. O importante é ter discernimento do que realmente vale a pena, sem ir contra nossa natureza e valores. 

Tempos atrás fiz um workshop sobre liderança e os pontos fortes identificados nos levantamentos sobre meu estilo de liderança estavam relacionados com a interação com pessoas. Isso me fez refletir que este é o meu diferencial. Ser humano antes de profissional. Respeito ao próximo, seja ele cliente, fornecedor ou funcionário, ética nas negociações e decisões, enxergar por trás de cada pessoa o que pode estar influenciando nas reações e atitudes. 

Não importa quanto digital o mundo está se tornando. Atrás de cada perfil, de cada post, de cada tweet, existe uma pessoa. Então fica aqui o meu palpite: um bom profissional de marketing está amplamente informado, antenado, conectado, conhece todas as ferramentas on-line e off-line, mas, fundamentalmente, é capaz de entender os anseios dos seres humanos que chamamos displicentemente de clientes.

*Cristina Blanco é diretora de Marketing da EMC Brasil

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