É essencial ter um CONTRATO BEM FEITO, para mitigar riscos e preservar a relação entre as partes. Principalmente quando estamos falando de um contrato de prestação de serviços de implantação de sistema.
Uma das implantações mais críticas é de ERP (Enterprise Resource Planning), um conjunto de softwares interligados que proporcionam o gerenciamento completo da empresa, interligando vários departamentos, como finanças, recursos humanos, logística, compras, vendas e produção, entre outros.
Estamos falando de uma prestação de serviços que impacta todo o negócio e envolve todas as áreas, dada a atuação do sistema. Logo, passar por um processo de implantação de ERP por si só não é nada fácil, ainda mais acompanhado de algumas das seguintes situações:
a) Implantação em atraso, o cronograma já foi revisto várias vezes e parece que nunca evolui!
b) Faltam usuários chave
c) Consultores são substituídos com frequência e todo o histórico se perde
d) O pagamento previsto pelo serviço já foi realizado e o sistema ainda nem entrou em produção
e) O layout não atende o processo da empresa porque na verdade é preciso fazer uma customização
f) Um ou dois módulos estão implantados mas de nada adianta já que é necessário ter o todo
Esses são apenas alguns dos percalços que surgem ao longo do caminho. Então o que fazer? É importante que a TI e o jurídico estejam bem alinhados para blindar essa minuta. Firmar um contrato é essencial, pois a regra do jogo precisa estar no jogo!
Primeira dica:
Devemos tomar muito cuidado com propostas que tratam de questões contratuais!
Segundo dica:
Art.427 do CC: A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.
O Jurídico tem que ser envolvido desde o começo, ainda na fase de proposta se possível e com certeza antes do “De Acordo”. Isso permite que o advogado já identifique se no documento há tratativas que vão além de questões negociais, como preço, prazo, entre outros.
Terceira dica:
Faça as considerações inicias! Deixe claro logo no início do contrato, por meio de “Considerandos”, qual a intenção das partes com aquela contratação. Tal prática é relevante, pois diante de uma discussão judicial, pode auxiliar o Juiz a entender qual era a INTENÇÃO das partes no momento da contratação e assim auxiliá-lo a encontrar a melhor solução para o caso.
Quarta dica:
Tenha um GLOSSÁRIO! Definir o entendimento que se deve ter sobre termos que possam gerar interpretações diversas, como por exemplo, manutenção corretiva, manutenção preventiva, customização, erro no sistema, etc.
Quinta dica:
Descreva de forma clara e objetiva o serviço contratado! Se a proposta comercial não está clara, aqui é a chance de tentar amenizar o risco. Coloque por escrito o combinado para evitar discussão sobre o que de fato está no escopo.
Aproveite esse momento para redigir uma cláusula onde fique estabelecido que a implantação do sistema apenas será considerada concluída, válida e efetiva após a realização de todos os testes e posterior homologação pela contratante de todos os módulos objeto da contratação.
Nem sempre uma implantação parcial atende as necessidades da empresa, logo, deixe claro isso. O que está sendo contratado é um sistema e não módulos! Nem sempre isso está claro e o judiciário acaba tendo que decidir, o que faz com que o processo se estenda ainda mais e tenha uma dependência maior do resultado da perícia técnica.
Sexta dica:
Jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL – CONTRATO DE IMPLANTAÇÃO DE SOFTWARE E SERVIÇOS – DESCUMPRIMENTO PARCIAL POR PARTE DA CONTRATADA – RESCISÃO A PEDIDO DA CONTRATANTE – RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS – DIREITO RECONHECIDO APENAS EM RELAÇÃO AOS MÓDULOS EFETIVAMENTE ADQUIRIDOS E NÃO IMPLANTADOS – APURAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO – DANOS MATERIAIS COM A CONTRATAÇÃO DE OUTRA EMPRESA – DIREITO NÃO RECONHECIDO – ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA – DISTRIBUIÇÃO PROPORCIONAL À PERDA EXPERIMENTADA POR CADA PARTE. (TJMG, Ap. 1.0024.07.804216-5/001, Relator Arnaldo Maciel, julhado em 19/03/2013)Jurisprudência:
Caso: Prestação de serviços de fornecimento e implantação de Software. Rescisão do contrato. Restituição e Indenização. Ação procedente. R$180.000,00.
“Valendo-se do exemplo de uma empresa contratada para desenvolvimento de um carro personalizado que, após o prazo combinado, não apronta nenhum dos módulos necessários ao funcionamento do veículo, ocasionando a imprestabilidade do trabalho inconcluso a uma hipotética terceira empresa contratada para finalização do projeto.” (TJSP, Ap. 9134212 – 58- 2007. 8.26.0000, Relator Lino Machado, julgado em 29/02/2012)
Em uma implantação de sistema é essencial a parceria entre as partes e o envolvimento de ambas na execução do trabalho. Isso porque a contratada tem o kwon how sobre a metodologia da implantação, mas a contratante tem a experiência e o conhecimento das rotinas do negócio. Por isso da figura do usuário chave, que além de replicar o que aprendeu sobre o funcionamento do sistema é também quem apoio no detalhamento do processo, na fase de testes e na homologação.
Segue abaixo um caso onde o sistema por si só não atendia as necessidades da contratante, sendo necessário realizar customizações. Contudo, elas não ocorreram e a contratada alegou que isso era de responsabilidade da contratante, que deveria fazer o gerenciamento do projeto como firmado no contrato. Ocorre que no contrato esta atividade estava sem descrição. Como gerenciar algo que não se conhece? Para o juiz deste caso o gerenciamento deveria consistir apenas no repasse das informações da contratante para a contratada, já que ela não tem o conhecimento para realizar a tal customização.
Caso: Prestação de serviços e licenciamento de software. A ré alega que as customizações não foram realizadas por culta da autora. Fato não demonstrado. Ação de rescisão contratual PROCEDENTE. Devolução de valores R$101.632,08.
(TJSP, Ap. 9204111-17.2005.8.26.0000, Relator Cláudio Godoy, julgado em 14/02/2012)
Portanto, detalhe as atividades e as responsabilidades no contrato! Isso evita discussões sobre quem deve fazer o que e em que momento.
Pode ser definido na proposta, em Anexo Contratual, no cronograma ou no próprio contrato.
Sétima dica:
Em um contrato de implantação de sistema é indispensável que o pagamento esteja amarrado a entregas ou atividades. Isso evita que o contratante termine de realizar o pagamento antes de receber o que foi contrato. Quando isso ocorre o contratante perde seu poder de barganha, sua força de pressão para que o serviço ocorra e acaba sendo o último da fila. Não é raro as renegociações de prazo. Mesmo quando não há um cronograma de trabalho já montando é possível amarrar o pagamento as atividades, pois toda implantação possui uma metodologia de trabalho com fases definidas.
Recomenda-se ainda que cada etapa ou atividade seja homologada pela contratante.
Segue abaixo uma caso onde essa amarração fez toda a diferença! A contratada entregou o trabalho, porém com ajustes pendências, erros no sistema que precisavam ser sanados. Tais correções levaram 2 anos. Como o pagamento estava amarrao a implantação devidamente homologada, não cabia a contratada receber antes. Motivo pelo qual ela perdeu a ação de cobrança.
Caso: Locação de Software. Cobrança de Pagamento. Ação Improcedente.
A autoria alega que a implantação ocorreu em 02/02/1998 e que, embora a locatária tenha apontado alguns pontos pendentes para a perfeita utilização do software, teria utilizado a ferramenta sem qualquer pagamento, desde 1998 até 2000, quando foi concluída as pendências e ajustes existentes sobre o Software.
Juiz julgou antecipadamente o mérito, pois no contrato estava claramente descrito que o pagamento pela locação, manutenção e suporte técnico apenas seria exigido após 182 (cento e oitenta e dois dias) contados da data da implantação e aceite do software. Não há nem necessidade de produção de provas. (TJSC, Apelação Cível n. 2007.040589-2, rel. Des. Ronei Danielli, julgado em 24/05/11).
Oitava dica:
Importante colocar por escrito o cronograma dos trabalhos! Ter uma prazo é essencial para verificar eventuais atrasos já durante a execução (ainda que em etapas intermediárias), bem como para caracterizar inadimplemento contratual caso ele não seja cumprido.
A maioria dos casos que leva a rescisão dos contratos de prestação de serviços de implantação de ERP está relacionada ao não cumprimento do prazo estabelecido para o término dos trabalhos.
Caso: Ação de indenização, buscando a autora restituição – dos valores por ela despendidos em razão da não implementação do sistema nos termos contratados. Sentença de procedência da ação. Recurso improvido.
A ré comprometeu-se, mediante contrato escrito, a prestar serviços de consultoria para implementação do’ software conhecido como […] para agilizar processos operacionais de gestão, finanças, – controladoria, materiais, armazéns, vendas e distribuição, transportes, atividades de cesta de serviços e manutenção em empresa voltada para transporte de cargas. Bem por isso, escoado o prazo contratual sem que o sistema tenha entrado em operação efetiva, havendo, ainda, subsídios que indicam o abandono da empreitada pela ré, deve ela indenizar a autora pelos prejuízos sofridos. (TJ/SP, Apelação n° 992.07.026280-1,Rel Des. Kioitsi. Chicuta, julgado em 28/01/2010)
É possível também no contrato atrelar eventuais multas por descumprimento de prazo, dando um limite máximo, sob pena de rescisão de contrato.
Nona dica:
Inserir obrigação de confidencialidade! Ela deve estar presente na proposta comercial, no contrato e até mesmo em documento anterior, pois as vezes para elaborar a proposta já se faz necessário fornecer informações sobre o negócio.
Décima dica:
Também precisamos estar preparados para um mudança de fornecedor caso necessário. Para tanto é recomendado incluir uma cláusula de Repasse das informações e documentação. Os custos desse repasse serão arcados pela Contratada diante de resilição ou rescisão contratual por sua culpa.
Décima primeira dica:
Customização é um assunto delicado na maioria das implantações de sistema. Isso porque muitos atrasos na conclusão do projeto ou gastos excedentes decorrem de customizações não previstas e que só foram identificadas ao longo da execução dos trabalhos. Uma dica para tentar pelo menos amenizar esses gastos é tentar compartilhar com o desenvolvedor o custo. Como assim? Muitas customizações são feitas para um cliente e depois incorporadas como melhorias ao sistema beneficiando outros. Insira uma cláusula no contrato para tratar previamente sobre os tipos abaixo, bem como sobre preço:
• Desenvolvimentos feitos exclusivamente para a CONTRATANTE.
• Desenvolvimentos que serão incorporados à plataforma, feitos mediante solicitação da CONTRATANTE.
• Desenvolvimentos que serão incorporados à plataforma, que não foram realizados mediante solicitação da CONTRATANTE.
Décima segunda dica:
É importante redigir uma cláusula sobre propriedade intelectual principalmente nos casos que envolvem código-fonte, tais como serviços de desenvolvimento, customização ou melhoria de softwares.
Os direitos autorais sobre os desenvolvimentos de softwares contratados sob encomenda serão da contratante, salvo disposição em contrário entre as partes (Lei 9.609/98, artigo 4º).
Quando por uma questão de custo ou até mesmo de estratégia de mercado a contratante abre mão da propriedade do que foi desenvolvido para que seja comercializado pela contratada no mercado, porém quer uma garantia de que poderá ao longo do tempo usufruir e ter uma continuidade do que foi contratado, mesmo que a contratada desista desse mercado, ela poderá recorrer a cláusula de escrow, que nada mais que o depósito do código fonte e de sua documentação técnica em um terceiro de boa-fé.
Décima terceira dica:
Alguns contratos de implantação de sistema acabam também trabalho de manutenção. Quando isso ocorrer não esqueça de especificar claramente qual o tipo de manutenção contemplada, exemplo: corretiva, adaptativa (que envolve atualização em decorrência de legislação) e evolutiva.
Alerta: Ao tratar de manutenção programada, dependendo do ramo de atividade da empresa, não basta um prazo de 24 horas, é importante que elas nunca ocorram perto de determinadas datas, como por exemplo, fechamento de mês, datas comemorativas (quando o rama é varejo), entre outra.
Estabeleça ainda um acordo de nível de serviço (conhecido também por ANS ou SLA), para deixar claro qual o tempo de resposta e resolução diante de um chamado aberto ao suporte. Além dos prazos de atendimento, é importante também as cláusulas penais e em que situação caberá uma rescisão motivada.
Décima quarta dica:
O prestador de serviço precisa conhecer e agir em conformidade com a Política de Segurança da Informação da contratante. O tratamento das informações e dos dados compartilhados entre as partes deve seguir a referida política, bem como a norma de classificação da informação e demais normativos aplicados. Portanto, é preciso inserir um cláusula sobre Segurança da Informação.
Décima quinta dica:
Gere documentação de tudo que foi repactuado ao longo do período de implantação, seja por e-mail, ata de reunião ou aditivo contratual. Principalmente assuntos relacionados a prazo, cronograma, atividades executadas por cada parte ou customização, pois são os pontos mais discutidos em ações judiciais que tratam sobre rescisão contratual ou indenização em decorrência de implantação de sistema.
O contrato de prestação de serviços de implantação de ERP deve ser como bula de remédio, ou seja, deve refletir as expectativas das partes, bem como os direitos e obrigações, além de contemplar o maior número de situações possíveis! Um contrato bem escrito traz celeridade na resolução de conflito e muitas vezes evita que as partes recorram ao judiciário.
(*) Sandra Paula Tomazi Weber é sócia diretora do Escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, pós-graduada em Direito Contratual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP); pós-graduada em Direito Civil e Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR); com curso de extensão em Direito da Tecnologia da Informação pela Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro; com extensão em Contratos de Consumo e Atividade Econômica pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. Coautora do audiolivro “Direito Digital Corporativo”, pela Editora Saraiva e do livro Direito Digital Aplicado, pela Editora Intelligence. Membro da Comissão de Ciência e Tecnologia, da Ordem dos Advogados do Brasil, seção de São Paulo.
A Pure Storage está redefinindo sua estratégia de mercado com uma abordagem que abandona o…
A inteligência artificial (IA) consolidou-se como a principal catalisadora de novos unicórnios no cenário global…
À primeira vista, não parece grande coisa. Mas foi na pequena cidade de Pornainen, na…
O processo de transição previsto na reforma tributária terá ao menos um impacto negativo sobre…
O que antes parecia uma aliança estratégica sólida começa a mostrar rachaduras. Segundo reportagem do…
O Departamento de Defesa dos Estados Unidos firmou um contrato de US$ 200 milhões com…