Muito além do bitcoin, o blockchain – tecnologia por trás da famosa criptomoeda – começa a ganhar força em diversos setores ao redor do mundo. Entre especialistas, não há dúvidas de que o blockchain veio para ficar e nos próximos anos tende a gerar oportunidades nos negócios, nas empresas e no mercado de trabalho. Basta observar as previsões feitas por consultorias e empresas de pesquisa.
Em seu mais recente relatório, publicado em agosto, a IDC estima que os gastos mundiais com soluções de blockchain devem chegar a quase US$ 16 bilhões (mais precisamente, US$ 15,9 bilhões) em 2023. A cifra será atingida a uma taxa de evolução anual digna de crescimento chinês, na ordem de 60%, no período entre 2018 e 2023.
Somente neste ano, a expectativa é de que os dispêndios com blockchain saltem 80% em relação a 2018. Os investimentos tendem a ser puxados pelo setor bancário, que abocanhará 30% do volume de recursos aplicados em soluções de blockchain até 2023. Não é para menos, já que grandes instituições financeiras em todo o mundo têm olhado de perto as aplicações de plataformas como Hyperledger e Ripple, entre outras.
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A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), inclusive, anunciou em junho deste ano a criação da primeira rede de blockchain do sistema financeiro brasileiro, num projeto colaborativo que tem participação de grandes bancos – Banrisul, Bradesco, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Itaú Unibanco, JP Morgan, Original, Santander e Sicoob (um dos maiores sistemas de cooperativas financeiras). A ideia é que a iniciativa possibilite o compartilhamento de informações entre as instituições parceiras.
Ainda que o setor financeiro domine as discussões sobre blockchain – o que se justifica dada a popularidade do bitcoin e outras criptomoedas nos últimos anos –, o potencial da tecnologia não se restringe a finanças. Grandes companhias, como Carrefour, Cargill e Walmart, têm adotado o blockchain em suas operações mundo afora. Também recentemente a Nestlé firmou uma parceria com a plataforma OpenSC para um projeto piloto que permitirá aos consumidores rastrear dados sobre a comida, como informações sobre sustentabilidade e cadeia de suprimentos.
O avanço do blockchain nos negócios vai, ao longo do tempo, criar oportunidades de carreira, assim como outras tecnologias já fizeram
Projetos estão em fase embrionária
Projetos de logística são um bom exemplo de como o blockchain pode ser utilizado nos negócios, segundo a advogada Rosine Kadamani, cofundadora da Blockchain Academy. Embora existam alguns movimentos, a adoção da tecnologia no Brasil é incipiente. Há, sim, oportunidades, a começar pelo potencial consumidor, avalia. Mas as travas são inúmeras. “Não somos um país rico em termos de investimentos, e os projetos que dependem de tecnologia de ponta precisam de fôlego. Com isso, acabam dependendo de esforços privados”, diz.
Uma das barreiras para o avanço da tecnologia, e isso não se limita ao Brasil, é a dificuldade de compreensão do conceito, afirma Eduardo Diniz, coordenador do curso “Blockchain: aplicações e transformação dos negócios”, da Fundação Getulio Vargas (FGV). Mais do que isso, o processo de implantação não é algo simples, e demanda mudanças na estrutura organizacional. Isso porque para um projeto com uso de blockchain funcionar é preciso ter uma rede de confiança que aceite o fluxo de informações.
A IBM está à frente de alguns pilotos de projetos que utilizam blockchain, conta Carlos Rischioto, líder técnico de blockchain da IBM Brasil. Em parceria com a multinacional, por exemplo, a startup carioca Growth Tech desenvolveu uma plataforma que permite solicitar e acompanhar serviços de cartório em ambiente virtual, como procurações, registros de nascimento, óbito e união estável. “A rede de blockchain não substitui os processos de cartório. A diferença é que automatizamos toda a comunicação entre as etapas e os próprios cartórios.”
Tecnologia abre espaço para profissionais
O avanço do blockchain nos negócios vai, ao longo do tempo, criar oportunidades de carreira, assim como outras tecnologias já fizeram ou ainda fazem. Cientistas de dados se tornaram uma figura bem requisitada em empresas justamente com a evolução de big data, data science e analytics nos últimos anos. No caso do blockchain, a tendência é que surjam profissionais especializados, como desenvolvedores. “Hoje, quem está trabalhando nisso está em outras carreiras. Um lugar que certamente está gerando impacto é na ciência da computação, porque começa a ter necessidade de gente que programa com essa lógica”, aponta Diniz, da FGV.
Para quem quer ingressar na área, a recomendação inicial são os cursos online. É importante estudar criptografia e como funcionam as plataformas
Criada em 2016, a Blockchain Academy oferece cursos de capacitação sobre blockchain em diferentes níveis, desde treinamentos básicos para quem tem curiosidade em conhecer o tema até conteúdo aprofundado para profissionais que querem aprender a desenvolver em plataformas como Hyperledger, Ehereum e Corda. Recentemente, foi criado também um curso específico de blockchain para advogados, com uma turma de 35 alunos. Em setembro, será lançado, ainda, um curso para profissionais do mercado financeiro.
“Entendendo o que é, a pessoa pode descobrir o que a atrai mais nesse mundo, por exemplo, desenvolvimento [de plataformas], mercado financeiro, questões jurídicas”, observa Rosine. Fazer um curso é uma boa pedida, claro, mas o caminho das pedras inclui acompanhar as notícias sobre a evolução da tecnologia e das centenas de plataformas, assim como participar de eventos.
O conhecimento sobre a área ainda está sendo sedimentado, lembra Diniz. “Estamos formando uma massa crítica de especialistas que entendam do assunto. A grande procura é por conhecimentos gerais a respeito de blockchain, com cursos mais generalistas”, aponta. Não por acaso, a FGV lançou no ano passado a primeira edição do curso “Blockchain: aplicações e transformação dos negócios”, em parceria com o centro de pesquisa canadense Blockchain Research Institute (BRI). A turma inaugural contou com profissionais dos setores de saúde, imobiliário, financeiro. “É um sinal de quem está começando a ficar atento ao potencial do blockchain”, diz o professor.
Por mais que a tecnologia esteja em estágio embrionária, já há procura por profissionais com experiência em linguagens específicas de blockchain, diz Rischioto. Outra demanda, que ainda não apareceu no Brasil, é por pessoas para atuar com governança de rede de blockchain, segundo ele. “É um papel mais gerencial de criar as regras de governança da rede. Alguém vai ter que sentar e escrever o regulamento da rede”, diz. No caso de programadores de contratos inteligentes (os chamados smart contracts), ele indica realizar cursos de linguagens de programação e participar de grupos e fóruns de discussão sobre plataformas de blockchain. Outra dica dos especialistas é ir atrás de cursos mais amplos, como um MBA oferecido pela Fiap.
O economista Courtnay Guimarães, 49 anos, é um ehttps://stg.itforum.com.br/wp-content/uploads/2018/07/shutterstock_528397474.webpso de blockchain. Desde 2014, ele acompanha de perto a tecnologia. Inclusive por ter trabalhado durante muito tempo com segurança da informação, a criptografia é um dos assuntos que está em seu radar desde a década de 1980. Começou a carreira como programador e, ao longo da carreira, passou por empresas como HP, SAP e Oracle. Após retornar de um período sabático, no início deste ano, ele assumiu o cargo de cientista-chefe da BRQ Digital Solutions e também é diretor de tecnologia da Associação Brasileira de Criptoativos e Blockchain (ABCB).
Para quem deseja ingressar na área, Guimarães recomenda procurar inicialmente cursos online. É importante, segundo ele, estudar criptografia e como funcionam as plataformas, mas também como se configura uma aplicação que utiliza blockchain e a integração nos sistemas corporativos. “Na prática, precisa ser programador com boa dose de infraestrutura e o diferencial em relação ao mundo tradicional é que precisa saber mais sobre segurança da informação”, destaca.
Blockchain inspira criação de startups
O potencial do blockchain não tem atraído somente grandes empresas. No mundo, existem 1.139 startups que usam a tecnologia, de acordo com a empresa de pesquisas Venture Scanner. O Brasil, por sua vez, engatinha: das 12.767 startups cadastradas no banco de dados da Associação Brasileira de Startups (ABStartups), menos de 50 negócios utilizam blockchain, segundo levantamento feito pelo IT Trends a partir do StartupBase, banco de dados da associação.
No mundo, existem 1.139 startups que usam blockchain, de acordo com a Venture Scanner. O Brasil, por sua vez, engatinha: das 12.767 startups cadastradas no banco de dados da ABStartups
A Plataforma Verde é uma delas e tem ganhado mercado, não apenas em território nacional, como também em outros países. Fundada pelo engenheiro português criado no Sul do Brasil Chicko Sousa, a startup possibilita que empresas façam um rastreamento de diversas etapas do gerenciamento de resíduos. Tudo online. O negócio começou com um projeto-piloto feito com a montadora francesa Renault, em 2016, e ganhou tração ao longo dos últimos anos. Atualmente, 1.500 companhias de 18 mercados diferentes utilizam o sistema, entre elas, Carrefour, Ferrero Rocher, Mondelez, Renault e Riachuelo.
“O que desenvolvemos é um sistema crowdsourcing [modelo de colaboração ou construção coletiva], em que as melhorias pedidas pelos clientes são colocadas na plataforma”, explica. Na prática, a plataforma permite rastrear todos os processos industriais da cadeia, desde extração de matéria-prima até destinação de resíduos sólidos. “Controlamos desde diferença de pesagem, diferença de descrição de produto, atendimento legal.”
Com uma equipe de mais de 70 pessoas em São Paulo, a empresa abriu recentemente um escritório em Londres e está prestes a inaugurar sua presença física em Los Angeles. Segundo o empreendedor, há uma demanda crescente de países africanos e da Índia pela solução. Por enquanto, o negócio atende clientes de países como Chile e Estados Unidos (piloto na Califórnia para rastreio de frutas) e, recentemente, fechou contrato com a Sérvia para operar lá a partir de dezembro deste ano.
Já a Owl Docs é uma plataforma de gestão de documentos corporativos que conta com assinatura digital e contratos inteligentes baseados nas redes Ethereum e Hyperledger. Criada pelo analista de sistemas Bruno Kenj, a startup iniciou a operação em 2016 e, no ano seguinte, foi acelerada pela Startup Farm. De lá pra cá, o empreendedor tem direcionado esforços para atingir instituições do setor financeiro, como bancos, corretoras de investimentos e gestoras de recursos. Hoje, a Owl Docs atende o Paraná Banco, instituição de médio porte, a Fundação de Previdência Complementar do Estado de Minas Gerais (Prevcom-MG) e uma gestora de recursos.
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